quarta-feira, 10 de outubro de 2012

A sombra do caudilho





    Até às eleições regionais de Dezembro Hugo Chávez continuará a manter um alto nível de despesa pública, mas em 2013 chegará a ressaca que marcará a derradeira fase da governação do caudilho venezuelano.

   Com cerca de 8 milhões de votos e 55% dos sufrágios Chávez conseguiu a quarta vitória em eleições presidenciais, mas averbou a menor vantagem desde o primeiro triunfo em 1998.

   A taxa de abstenção caiu para os 19%, a mais baixa das últimas três décadas, e Henrique Capriles subiu a votação da oposição dos 4,2 milhões conseguidos por Manuel Rosales em 2006 para 6,4 milhões de votos.

   A reeleição de Chávez numa votação que reuniu o maior número de sempre de participantes, cerca de 15 milhões, foi indiscutível com uma vantagem de 11% sobre o rival, mas aquém dos 63%, 60% e 56% averbados em 2006, 2000 e 1998.

   Batendo o rival em 22 dos 23 Estados e no Distrito Capital (Caracas) -- incluindo Miranda que Capriles governou desde 2008 até Junho para se candidatar à presidência -- Chávez contudo pouco aumentou a sua base eleitoral que chegara aos 7,3 milhões de votantes em 2006.

   A polarização social persiste e uma fuga para a frente é a via mais provável para o chavismo que dentro de dois anos tentará renovar a maioria absoluta do seu Partido Socialista Unido da Venezuela na Assembleia Nacional.

   Para alargar sobretudo os quadros do funcionalismo, programas de construção de habitação social e subsídios à alimentação e saúde, a despesa pública aumentou 30% em termos reais nos últimos doze meses, segundo estimativa do “Bank of America-Merrill Lynch”.

  Tendo acentuado desde 1999 a dependência do petróleo, responsável por mais de metade das receitas do estado e acima de 90% das entradas de divisas, a Venezuela, não irá conhecer qualquer diversificação económica tanto mais que nacionalizações nos sectores energético e alimentares são apontadas como prioridades.

   O estado, que assegura mais de 1/3 dos investimentos, tenderá, assim, a aumentar a sua quota parte ante a retracção de capitais estrangeiros.

   A produção de crude no país com as maiores reservas de petróleo caiu 22% desde 1999, totaliza actualmente os 2,52 milhões ou 3 milhões de barris/dia, consoante estimativas independentes ou oficiais, e deverá continuar a baixar na ausência de investidores privados estrangeiros.

   Uma forte desvalorização do bolivar é praticamente certa no início de 2013 e a dívida externa deverá continuar a ser sustentada por empréstimos de Pequim que nos últimos cinco anos totalizaram cerca de 42,5 mil milhões de dólares cobertos por quase um terço dos 640 mil barris de crude exportados diariamente para a China.

   A inflação, rondando os 20%, ameaça as expectivas de crescimento económico que, segundo as previsões do FMI, deverá atingir 5,7% este ano -- acima dos 3,2% apontados para a América Latina -- e 3,3% em 2013.

   Graças à alta do petróleo – o barril quedava pelos 10 USD à chegada de Chávez ao poder – os programas assistencialistas estatais, em ruptura com a governação das oligarquias tradicionais, levaram a uma redução da pobreza de 56% em 1997 para 27% em 2011.

   As estatísticas oficiais registam, ainda, uma taxa de desemprego de 8% apesar de metade da população continuar relegada para o sector informal de uma economia flagelada pelo racionamento de electricidade, infraestruturas insuficientes e de má qualidade que têm um efeito tão destabilizador quanto os aterradores 14 mil assassínios anuais registados pelas autoridades.

   Os constrangimentos económicos e financeiros apontam para uma radicalização do chavismo.

   Será risco excessivo para o regime assistir a uma desabrida contenda pela sucessão dado o incerto estado de saúde do caudilho de 58 anos que iniciará a 30 de Janeiro um mandato de seis anos renovável indefinidamente.
   
   A eventualidade de morte, incapacidade física ou mental nos primeiros quatro anos obrigaria a eleições antecipadas dado que o vice-presidente Elías Jaua só poderia suceder a Chávez para concluir o mandato sem recurso a novo acto eleitoral a partir de 2017.

(Nota: Chávez nomeou a 10 de Outubro o Ministro dos Negócios Estrangeiros Nicolás Maduro como vice-presidente. Elías Jaua foi anunciado como candidato a governador do estado de Miranda concorrendo contra Capriles)

   Confrontado com uma frente de oposição congregando desde conservadores a social-democratas e socialistas que se não se desgregar conta em Capriles com um candidato mobilizador e livre de conivências com as velhas oligarquias, não é de descartar que Chávez promova nova revisão constitucional, tal como em 2009, para garantir a continuidade do regime nomeando um sucessor.


Jornal de Negócios
10 Outubro 2010

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