sexta-feira, 7 de setembro de 2012

A União Europeia rumo à desordem africana




   A missão da ONU e da União Africana para o Darfur provavelmente só no final do ano conseguirá colocar no terreno os 26 mil militares do contingente multinacional destacado para as regiões ocidentais do Sudão, admitiu esta semana o responsável pelas missões de paz das Nações Unidas Jean-Marie Guéhenno.

   Apenas 9 mil homens se encontram presentemente no Darfur e a missão ainda não dispõe de helicópteros em número suficiente para patrulhar uma região cinco vezes maior do que Portugal.

   Os atrasos, agravados pela obstrução sistemática do governo de Cartum, comprometem a eficácia da força multinacional que arrisca um desempenho tão fruste quanto as falhadas operações de protecção às populações civis iniciadas pela União Africana em 2004, um ano após o agravamento do conflito. 

   A reduzida presença militar internacional no Darfur compromete as perspectivas de sucesso da missão que a União Europeia aprovou esta semana para o leste do Chade e o nordeste da República Centro-Africana.
 
                                      Sob o manto da França

  A partir de Março caberá a 3 700 militares europeus garantir a segurança de mais de 240 mil refugiados do Darfur, 180 mil deslocados no Chade e outros 43 mil refugiados internos na República Centro-Africana.

   A Eufor Tchad-RCA deverá actuar em conjugação com a Missão da ONU na República Centro-Africana e no Chade que conta de momento com 300 polícias internacionais e 850 agentes de segurança chadianos para proteger os campos de refugiados e deslocados.

   A maior missão militar da UE fora da Europa e sem contributo da NATO tem duração prevista de um ano e na prática é uma iniciativa francesa já que Paris contribui com 2.100 homens e a maioria dos helicópteros.

   Um general francês comanda as forças no terreno em Abéché, no leste do Chade, ainda que a operação seja dirigida pelo general irlandês Patrick Nash a partir de um quartel-general nos arredores de Paris.

   O contingente de 1 100 homens que a França mantém em permanência no Chade desde a independência em 1960 não participa directamente na operação apesar de poder oferecer apoio aéreo graças aos Mirage que tem estacionados na capital.

  Dos 27 parceiros europeus, a Irlanda disponibilizou 430 homens, a Polónia 350, a Suécia 200 e a Roménia 120, enquanto os demais estados colocam oficiais no quartel-general de Mont Valérin e, nalguns casos, contribuem com meios aéreos como acontece com Portugal que avança com um C 130 e respectiva tripulação.

                                 Dois países em desordem

   Na antiga colónia francesa do Chade, a missão europeia é vista como um seguro de vida para o regime do Presidente Idriss Déby Itno.

   Desde que assumiu o poder num golpe de estado em 1990 com apoio da Líbia, Idriss Déby tem contado com o apoio de Paris para sustento do seu grupo militar que colhe apoios sobretudo nas chamadas regiões do Grande Norte: Borkou, Eunedi e Tibesti.

   Diversas facções que combatem o governo de N’Djamena operam na zona fronteiriça com o Sudão e uma presença militar europeia oferece maior margem de manobra a Idriss Déby.

   O presidente graças à exploração de petróleo iniciada em 2003 pode ainda contar com o apoio dos Estados Unidos, particularmente interessados também no contributo chadiano para a sua Iniciativa Anti-Terrorista Transaariana, e da China depois de Idriss Déby ter cortado relações diplomáticas com Taiwan, em Agosto de 2006.

   Na República Centro Africana, o contingente europeu é igualmente uma oportunidade para o presidente François Bozizé legitimado por eleições controversas em 2005 dois anos depois de ter derrubado pela força das armas o seu rival Ange-Félix Patassé.

   Bozizé confronta-se no noroeste do país com uma revolta de apoiantes de Patassé, refugiado no Togo, além de outras rebeliões tribais no nordeste a que se juntam as tradicionais razias na fronteira norte por parte de tribos oriundas do Chade.

   A França ainda não encontrou uma alternativa a Bozizé e viu-se envolvida no ano passado em confrontos directos com grupos rebeldes no norte da República Centro-Africana, tendo sido mesmo obrigada a reforçar com paraquedistas vindos do Gabão o contingente de duas centenas de militares que mantém em Bangui.

   Paris assegurou aos parceiros europeus que a missão militar no Chade e na República Centro-Africana não se imiscuirá nos conflitos internos das suas ex-colónias, mas a julgar pela virulência dos confrontos dos últimos meses nos dois países e somando-se o efeito destabilizador do Darfur são grandes as probabilidades dos militares da UE acabarem enleados nas desordens civis que enfrentam os regimes de N’Djamena e Bangui.



Jornal de Negócios
31 Janeiro 2008

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