domingo, 30 de setembro de 2012

Ganha Hollande e impõe-se a Alemanha


  
 
 
   Hollande dificilmente contará com apoios na Alemanha para abandonar ou desacelerar políticas de redução de défices orçamentais e dívida pública.
 
  A previsível derrota de Nicolas Sarkozy soa a dobre de finados pela estratégia de Angela Merkel de hegemonização política da eurozona, mas a chanceler continuará a opôr-se a transferências financeiras ou emissões de obrigações europeias que impliquem custos directos para os contribuintes alemães.

  A maioria do eleitorado alemão mantém uma apreciação positiva de Merkel ainda que sucessivas eleições estaduais tenham dilapidado o capital político da coligação governamental e condenado à irrelevância os liberais de Philipp Rösler.

   A votação de domingo em Schleswig-Holstein, deverá resultar no afastamento da actual coligação entre conservadores e liberais, podendo os social-democratas vir a formar governo com os verdes e um partido da minoria de língua dinamarquesa.

   Para o maior estado alemão, a Vestefália-Renânia do Norte, as sondagens indiciam que na eleição de 13 de Maio a coligação entre SPD e Verdes possa manter-se no poder em Düsseldorf.

   O SPD de Sigmar Gabriel ganha, assim, balanço na corrida para as legislativas de Setembro de 2013 e Merkel, esgotada a possibilidade de recuperação dos liberais, terá de admitir, pelo menos, a hipótese de retomar o entendimento à esquerda que vigorou no seu primeiro mandato entre 2005 e 2009.

                                  A Grande Coligação

   Merkel foi herdeira dos benefícios da "Agenda 2010" lançada por Gerhard Schröder em Março de 2003 que ao introduzir reformas de fundo no mercado de trabalho e na Segurança Social assentou as bases da actual fase expansionista da economia alemã, custando, no entanto, a reeleição ao chanceler em 2005.

   O SPD é dos primeiros a ter presente que a contestação à austeridade anti-inflacionária virada para a redução acelerada de défices orçamentais na eurozona irá acentuar-se com a eleição de François Hollande, mas, tal como os conservadores, os social-democratas recusam elementos cruciais da estratégia propalada pelo socialista francês.

    Uma vez no Eliseu, Hollande poderá levar a bom porto iniciativas para, por exemplo, reforçar projectos de criação de emprego financiados pelo "Banco Europeu de Investimento" no quadro da sua adenda ao "Pacto Fiscal", mas dificilmente contará com apoios na Alemanha para abandonar ou desacelerar políticas de redução de défices orçamentais e dívida pública.

   A esquerda alemã admite que a balança de pagamentos de Berlim não possa continuar a acumular saldos positivos ante a sangria de estados da eurozona e que o limite de tolerância a políticas que propiciam e acentuam recessões está prestes a ser ultrapassado, mas em causa alguma aceitará propostas radicais de mutualização da dívida pública ou uma revisão de estatutos do BCE que ponha em causa a prioridade ao controlo da inflação.

                                        A ilusão gaulesa 

    Apesar da "Standard & Poor`s" ter retirado, em Janeiro, a notação máxima a Paris os custos de endividamento da França mantiveram-se inalterados, incongruência que dificilmente persistirá se Hollande cumprir promessas eleitorais que pressupõem a manutenção de altos níveis de despesa pública incompatíveis com redução do défice orçamental e da dívida.

   A forte relutância a reformas de um mercado de trabalho enquistado ou de um sistema de prestações sociais insustentável, além do apoio ao proteccionismo, são cores fortes da paisagem francesa e não será um político baço e esforçado como Hollande a liderar uma ruptura na ausência de base social de apoio.

   O voto de protesto na Grécia – aproximando a admissão de bancarrota –, o desconcerto ante a dimensão da crise espanhola – insolúvel sem compromissos entre Madrid e as comunidades autónomas e purga da banca exposta à quebra imobiliária –, obrigam, no imediato, a declarações europeístas de empenho em medidas de apoio ao crescimento e criação de emprego.

                              Outras tiradas retóricas

   A busca de entendimentos entre Berlim e Paris implica mudanças retóricas quanto à dosagem de austeridade orçamental e estímulos ao crescimento e propiciará bravatas sobre a função de liderança da Comissão Europeia.

   Merkel passará do "diktat" à negociação morosa, mas, no essencial, não cederá sob risco de ser siderada pelo Tribunal Constitucional de Karlsruhe e o Parlamento de Berlim.

   Até que a ameaça de uma eventual implosão do euro ponha em causa os interesses alemães não se vislumbra que surja em Berlim um consenso sobre novas políticas financeiras e económicas que, de qualquer forma, terão de acarretar formas de integração institucionais inaceitáveis para a maioria dos eleitorados soberanos dos estados europeus.


Jornal de Negócios
2 Maio 2012

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