sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Dracmas e euros

Greek Prime Minister George Papandreou announces Greece's decision to request activation of a joint eurozone-International Monetary Fund financial-rescue plan on April 23.
George Papandreou anuncia pedido de auxílio financeiro
Kastelorizo, 23 Abril 2010


    Aguentar até às eleições de 9 de Maio na Renânia do Norte-Vestfália era o mínimo que o governo de Atenas tinha de fazer para não comprometer ainda mais Angela Merkel que terá de assinar o cheque mais vultoso, 8,4 mil milhões de euros, no prometido pacote de emergência para a Grécia.

    George Papandreou jogou, no entanto, a toalha ao chão na passada sexta-feira e ninguém lhe perdoará em Berlim se a coligação de Merkel perder a eleição no maior estado alemão e, em consequência, a maioria na câmara alta do parlamento, ficando à mercê de compromissos legislativos com a oposição social-democrata sobretudo em matéria fiscal e energética, dois dossiês que dividem conservadores e liberais.

   Esganado pelos mercados, atentos às reticências de Berlim e às estimativas de um défice orçamental de dimensão imponderável (13,6 % em 2009, mas que poderá atingir de facto os 14%, na estimativa do Eurostat de 22 de Abril, convindo recordar que em Novembro o novo governo ateniense referia 12,7 %, o dobro do registado pela contabilidade criativa dos conservadores derrotados pelos socialistas no mês anterior), fustigado com juros de devedor de altíssimo risco, marcado no calendário o dia 19 de Maio para o pagamento de compromissos de 8,5 mil milhões de euros, Papandreou não pode mais adiar o inevitável.

                             O primeiro de muitos empréstimos

   Por seis arrastados meses a União Europeia e, sobretudo os 16 estados do euro, tentaram evitar confrontar-se com uma questão política de fundo, mas, agora, tudo vai de arrasto com números arrepiantes e efeitos de contágio.

   O empréstimo de 30 mil milhões de euros dos 15 parceiros da Zona Euro por três anos com juros rondando os 5 %, mais 15 milhões de euros do FMI, aguentarão a Grécia à tona de água até ao final do ano.

   O resto resume-se a uma dívida pública de 300 mil milhões de euros (um salto de 99,2 % em 2008 para 115 % do PIB em 2009, consumindo já 32 % do orçamento, prevendo o governo ateniense 124 % no final deste ano), detida em 86 % por estrangeiros, com forte exposição de bancos franceses (79 mil milhões de euros), suíços e alemães (cerca de 45 mil milhões a dividir a meias pelos bancos e seguradoras de ambos os países).

    Projecções diversas sobre as necessidades de financiamento de Atenas vão, presentemente, dos 75 aos 90 mil milhões para cobrir compromissos nos próximos quatro anos que poderão orçar em 130 mil milhões de euros logo em 2012 quando os empréstimos da Zona Euro e do FMI em discussão atingirem a maturidade.

    A probabilidade do Governo de Atenas reduzir o défice orçamental para 2,8 % em 2012 diminui à medida que aumenta o serviço da dívida, tendo a contenção de despesas e investimentos de realizar-se num contexto de recessão com uma contracção prevista superior a 2% para este ano, segundo o governador do banco central grego, e um nível de desemprego nos 11 %.

    A resistência social a medidas de austeridade será virulenta num país em que um em cada quatro trabalhadores é empregado pelo Estado, representando as despesas com salários e pensões 80 % da despesa pública, enquanto diversos sectores profissionais beneficiam de estatutos privilegiados altamente penalizadores da capacidade competitiva do país.

   Fraude e evasão fiscais, juntamente com os piores níveis de corrupção da Zona Euro e da UE, a par da Roménia e Bulgária, que podem representar 8 % do PIB, segundo um estudo recente da Brookings Institution, não serão reduzidos para níveis razoáveis a curto prazo.

                                  A bancarrota e a reestruturação

   Depois da independência, em 1829, a Grécia viu-se obrigada a declarar bancarrota em 1893, tal como Portugal no ano anterior, mas metade do período ficou marcado por situações de desequilíbrio financeiro ou de reestruturação da dívida pública.

   A suspensão do pagamento da dívida e renegociação de novos prazos, complicada pela possibilidade dos contratos de seguro sobre dívida soberana puderem implicar clausulas penalizadores duma situação passível de ser equiparada a bancarrota, é uma hipótese crível no caso dos parceiros da Zona Euro não prosseguirem com novos financiamentos de urgência a Atenas.

   A Grécia representa apenas cerca de 2 % do PIB da Zona Euro, mas o risco de pressão acrescida sobre a dívida pública e instituições financeiras dos demais 15 estados em caso de bancarrota de Atenas é por demais elevado para a sustentabilidade do euro para que estados como a Alemanha ou a França deixem cair Atenas.

   A crise grega veio pôr a claro a impossibilidade de determinados países do euro, entre eles Portugal, puderem continuar a endividar-se para obviar a ineficiências de produtividade e capacidade competitiva e colocou na mesa a necessidade de rever mecanismos de supervisão para fazer cumprir os termos do Pacto de Estabilidade e Crescimento.

   A intolerância face a défices orçamentais superiores a 3 % e dívidas públicas para lá dos 60 % do PIB irá acentuar-se para defesa do euro, já que propostas como a criação de um Fundo Monetário Europeu implicam morosas revisões dos tratados existentes.

   O eventual regresso da Grécia ao dracma representa já um cenário aceitável para muitos decisores políticos, mas, quanto mais tarde tiver lugar tanto maior será o montante perdido nas operações de financiamento a Atenas promovidas pela zona Euro.

                         A farândola europeia com Atenas a cair fora

   A maior dificuldade política reside agora no facto de as urgentes discussões sobre disciplina orçamental, que se fará essencialmente pela redução da despesa pública e à custa a curto prazo do crescimento económico, terem lugar à medida que vão sendo improvisadas soluções de recurso para evitar a bancarrota grega.

   Uma eventual derrota da coligação governamental de Berlim na eleição da Renânia do Norte-Vestfália marcará um outro tempo nesta farândola europeia em que o círculo inicial dos dançarinos se vai desdobrando em diversas formações.

   O crescente custo político que possam representar as injecções de empréstimos para tentar evitar a falência grega passará muito em breve a ser uma das mais primordiais considerações de cálculo em Berlim e, depois, noutros países, como a Holanda, que já duvidam da viabilidade de manter a Grécia no euro.

Jornal de Negócios
28 Abril 2010

http://www.jornaldenegocios.pt/home.php?template=SHOWNEWS_V2&id=422385

Resultado eleição Landtag Renânia do Norte-Vestefália:
CDU 35%,  SPD 35%  Aliança 90/Verdes 12% FDP 7%, Die Linke 6%.

A social-democrata Hannelore Kraft sucedeu ao democrata-cristão Jürgen Rüttgers após formar um governo minoritário entre SPD e Verdes.

(Nota de Setembro 2012)

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