quarta-feira, 12 de setembro de 2012

A via para derrubar Mugabe

   Morgan Tsvangirai, incapaz de resistir à violência desencadeada pelo regime de Robert Mugabe, viu-se forçado a jogar tudo por tudo na pressão que os estados africanos possam impor ao regime de Harare.
   Depois de 28 anos no poder Mugabe irá declarar-se vencedor das presidenciais de candidato único e só restará uma saída à oposição: negar qualquer reconhecimento ao regime para criar uma dinâmica regional que possa isolar Harare.

   Uma condição necessária para levar os demais 13 estados da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC) a negarem legitimidade a Mugabe passa pelo boicote da Câmara de Representantes e do Senado por parte dos 109 deputados e 30 senadores que as duas facções do Movimento para a Mudança Democrática (MDC), lideradas por Arthur Mutanbara e Tsvangirai, elegeram em Março.

    Na ausência de condições de segurança a saída mais efectiva para Tsvangirai é o pedido de asilo político a um estado da SADC (Zâmbia ou Tanzânia surgem como os destinos mais viáveis) e a formação um governo no exílio.

    Sem estas iniciativas por parte da oposição do Zimbabué será difícil levar a SADC e a União Africana a isolarem politicamente o regime de Harare.

                              A hora da verdade para a África Austral

   O presidente da África do Sul, Thabo Mbeki, só alterará a sua equívoca mediação em nome da SADC no caso da maioria de estados da organização lhe retirarem o mandato e passarem a promover negociações visando a formação de um governo de transição que, depois de oferecer imunidade a Mugabe e aos principais dirigentes políticos e militares do regime, tenha por programa a organização de eleições legislativas e presidenciais.

    A oposição declarada a Mugabe de Jacob Zuma – líder do Congresso Nacional Africano e futuro presidente da África do Sul em 2009 – e da federação sindical COSATU estão, aliás, em vias de tornar insustentável a posição de Mbeki.

    Sem esta viragem por parte da SADC, ou, pelo menos, de uma maioria de estados da organização que actuem de forma concertada, dificilmente a União Africana admitirá isolar o Zimbabué e serão ineficazes sanções contra Harare.

    O agravamento das sanções impostas pela União Europeia, os Estados Unidos, o Canadá, a Austrália e a Nova Zelândia (recusa de concessão de vistos, congelamento de bens e interdição de transacções financeiras de 130 responsáveis do regime, corte de ajuda não-humanitária) de forma a visarem, além da elite de Harare, empresas ainda presentes no Zimbabué (caso das companhias de mineração britânicas Rio Tinto e Anglo American) terá pouco peso dado o colapso económico do país e a rede de conivências das gentes de Mugabe.

    Novas sanções terão, ainda, de ser sustentadas por um compromisso de apoio a um governo de transição e a disponibilização imediata de fundos para as futuras autoridades de Harare promoverem uma reforma monetária, condição indispensável para relançar o sector agrícola e mineiro.

                               Um risco para a segurança e a paz

    Alguns estados da África Austral poderão aplicar sanções políticas a Harare, mas congelar as remessas de emigrantes ou suspender fornecimentos de electricidade por parte da África do Sul estão fora de causa dada a situação de catástrofe económica.

    O muito provável agravamento da fuga de cidadãos do Zimbabué para África do Sul, mas também para o Botswana, Moçambique e Zâmbia, será um dos factores que a curto prazo deverão contribuir para uma mudança de política dos estados da África Austral.

   A possibilidade do Conselho de Segurança da ONU aprovar sanções políticas, financeiras, comerciais e, em último recurso, embargar a venda de armamento ao Zimbabué é ainda remota dadas as reticências da China e da Rússia.

   A adopção de sanções pela ONU só será politicamente viável em caso de agravamento brusco das condições de segurança, ameaçando a paz regional, que poderá ocorrer, muito provavelmente, devido a uma crise de refugiados nos países vizinhos.

                                  Uma questão de tempo

    As chefias das forças armadas, dos serviços de segurança e informação mostram-se, presentemente, indefectíveis no apoio a Mugabe, que mobiliza ainda as milícias de veteranos e jovens da ZANU PF.

    Os privilégios, uma longa conivência da elite militar com Mugabe – cimentada no início dos anos 80 nos massacres dos apoiantes da ZAPU de Joshua Nkomo entre a minoria ndebele –, a participação directa na administração de instituições económicas e financeiras contribuem igualmente para a intransigência do regime.

   As crescentes dificuldades económicas põem, no entanto, em causa a fiabilidade de grande número de militares e polícias, cujas famílias são atingidas pela degradação generalizada e crescente das condições económicas.

   Apesar de não existirem indícios de dissensões na elite militar é crível que ressurjam as divergências políticas que levaram em Dezembro de 2006 a conferência anual da ZANU PF a recusar o prolongamento do mandato presidencial de Mugabe até 2010 data em que seriam convocadas em simultâneo eleições presidenciais e legislativas.   

   Dois pesos pesados da ZANU PF pressionaram para obstar a um sexto mandato de Mugabe, mas as ambições do general Solomon Mujuru – marido da vice-presidente Joice Mujuru e político com significativa base de poder na Maxonalândia Leste – e de Emmerson Mnangagwa – homem forte da província de Midlands – acabaram frustradas pelos apoiantes do presidente.

    Um compromisso anunciado no final de Março de 2007 resultou na convocação das eleições simultâneas para a presidência (com mandato reduzido de seis para cinco anos), a assembleia legislativa, o senado e órgãos municipais.

    A candidatura presidencial do antigo ministro das finanças Simba Makoni, surgiu, entretanto, como mais um sinal de dissensões animadas por políticos afastados por Mugabe.

    A iniciativa para o isolamento político de Mugabe terá de partir da oposição interna para conseguir potenciar dissensões na ZANU PF, mas sem o apoio dos estados da África Austral e, muito em especial, da África do Sul, será difícil abrir a via para a democratização do Zimbabué.
Jornal de Negócios
25 Junho 2008

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