quinta-feira, 30 de agosto de 2012

É Putin e acabou-se!




   A modernização da economia e a emancipação da sociedade russa obrigam ao desmantelamento do sistema autocrático do putinismo.

   Para obstar aos indícios mais penosos de erosão política que as eleições legislativas de Dezembro deixaram a claro Vladimir Putin lançou mão de programas e promessas que obrigam a um incremento das despesas do estado dificilmente sustentável.

Aumentos do funcionalismo público e de subsídios sociais, manutenção das idades de reforma nos 60 anos para homens e 55 para mulheres, implicam um reforço anual do orçamento equivalente, segundo estimativa oficial, a 2% do PIB, montante que poderá chegar a 3% no final do mandato presidencial em 2018.

O reequipamento das forças armadas representa custos adicionais da mesma ordem de grandeza e um orçamento equilibrado (défice de 1% do PIB é previsão para 2012 depois de 2011 terminar com superavit de 0,8%) precisa de petróleo a 117 dólares o barril.

A despesa pública representa 39,1% do PIB e tenderá a aumentar, mas as condições económico-financeiras do putinismo deixam a desejar.

Não há Rússia sem senão
A dívida pública equivale a 11% do PIB, a balança de pagamentos apresenta excedente de 101 mil milhões de dólares, os fundos soberanos contam com 150 mil milhões de dólares, 2011 acabou com a mais baixa taxa de inflação do pós-comunismo (6,1%) e em Janeiro deste ano o desemprego cifrava-se em 6,6%.

Depois da bancarrota de 1998 a economia cresceu a uma média anual de 7% para se afundar 7,8% na sequência da crise financeira de 2008.

Desde 2009 o ritmo de crescimento abrandou e as estimativas oficiais apontam para médias futuras na ordem dos 4%, idênticas às registadas em 2010 e 2011.

O excedente da balança comercial (20,5 mil milhões de dólares em 2011) deriva das exportações de petróleo, gás natural e metais, como níquel ou paládio, que correspondem a mais de 80% das vendas.

A União Europeia absorve cerca de metade das exportações e os hidrocarbonetos (2/3 do total das vendas) equivalem a perto de 1/5 do PIB e 44% das receitas do estado, sendo inviável uma rápida reestruturação destes padrões.

O PNB per capita, ajustado por Paridade de Poder de Compra, atingiu, de acordo com o "Banco Mundial", 19 190 dólares no final de 2010, mas este estatuto de país de rendimento médio elevado é contrabalançado por acentuadas assimetrias regionais e padrões de distribuição de riqueza muito desiguais que colocam a Rússia a par da Venezuela.

À dependência do petróleo e a baixos índices de produtividade laboral (44% dos registados na Alemanha) junta-se a contracção demográfica que levará, segundo previsões oficiais, a que a população entre os 15 e os 65 anos venha a cair de

102,2 milhões em 2010 para 91,1 milhões em 2030, considerando um acréscimo via imigração de 4,5 milhões de habitantes.

A política comanda a economia
A Rússia apresenta óbices e barreiras anormalmente elevados em matéria de investimento, comércio e criação de empresas.

O peso do estado sobressai ainda no escasso número de pessoas activas a título individual ou em empresas com menos de 100 efectivos: 21% da mão-de-obra.

A persistente saída de capitais (84,2 mil milhões de dólares em 2011) redunda, por sua vez, numa fraca taxa de investimento interno privado.

As estruturas empresariais e as práticas predatórias administrativas - saídas dos confrontos entre grupos de interesses criados nas privatizações da era Ieltsin e agentes do processo de reafirmação da predominância do estado liderada por Putin - redundaram num sistema em que garantias legais pouco contam.

Uma corrupção ao nível da Nigéria, na referência da "Transparency International", torna a Rússia pouco propícia ao investimento e inovação empresariais e o contributo que a adesão à "Organização Mundial de Comércio" traga para uma melhoria das condições de concorrência não alterará o essencial.

O nó da questão
Um dos slogans mais contundentes da campanha do Kremlin asseverava: "Vota Putin e acabou-se".

O putinismo - sujeito à legitimação eleitoral e aos riscos da contestação das classes médias emergentes das grandes cidades - é, essencialmente, um sistema em que o poder, num regime presidencialista e centralista, se arroga a prerrogativa de controlar todas as alavancas da administração, os sectores essenciais da economia e justiça.

A modernização da economia e a emancipação da sociedade russa obrigam ao desmantelamento do sistema autocrático do putinismo.



Jornal de Negócios
07 Março, 2012

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