terça-feira, 28 de agosto de 2012

Os milhões roubados

  
 
   Entre 20 e 40 mil milhões de dólares por ano são apropriados ilicitamente por detentores do poder político nos países em desenvolvimento, numa singela estimativa do "Banco Mundial".
 
   Em contrapartida, apenas 5 mil milhões de dólares foram recuperados por via legal entre 1995 e 2010, segundo dados da "Stolen Asset Recovery Initiative", estabelecida em 2007 pelo Banco Mundial e o Departamento das Nações Unidas sobre Drogas e Crime.

O dinheiro sugado em actos de corrupção governamental representa, assim, o equivalente a 20% ou 40% das verbas anuais de ajuda global ao desenvolvimento.

A Suíça já não lava mais branco

Na sexta-feira, imediatamente após a demissão de Hosni Mubarak, o governo federal de Berna ordenou aos bancos suíços o congelamento de todos os activos que possam pertencer ao ex-presidente ou seus familiares.

A decisão da Suíça, válida por três anos, foi apoiada na segunda-feira por Jean-Claude Junker, o presidente do Eurogrupo, por Londres e Paris quando foi anunciado que as autoridades militares do Cairo tinham solicitado o congelamento de fundos eventualmente pertencentes a associados de Mubarak.

Idêntico pedido chegou a Washington, mas também neste caso não é claro se abarca expressamente bens de Mubarak e seus familiares.

Desde a entrada em vigor, a 1 de Fevereiro, da "Lei de Restituição de Bens Ilícitos", aprovada em Outubro de 2010 pelo parlamento suíço, a federação helvética reforçou consideravelmente os dispositivos de combate ao desvio e lavagem de dinheiro.

A legislação helvética permite o congelamento de bens suspeitos, mesmo no caso de determinados estados não terem capacidade para fazer prova de actos criminosos dos detentores de activos financeiros ou imobiliários na Suíça.

No caso de o suspeito não conseguir provar que adquiriu bens por via legal, a justiça suíça reserva-se o direito de os expropriar e reverter esses fundos para o estado lesado, através de programas de ajuda ao desenvolvimento de comprovado interesse público.

Na sequência de processos judiciais para recuperação de fundos desviados por políticos que remontam a 2002 com o caso Vladimiro Montesinos - chefe dos serviços secretos peruanos durante a presidência de Alberto Fujimori -, passando pelas fortunas de Marcos, Mobutu, Abacha ou Jean-Claude Duvalier, a justiça suíça devolveu aos estados lesados cerca de 1,8 mil milhões de dólares.

O deposto chefe de estado tunisino Ben Ali e Laurent Ngabo, o presidente da Costa do Marfim derrotado nas eleições de Novembro que recusa ceder o poder, têm congelados os seus bens na Suíça e arriscam a expropriação, mas o caso que presentemente mais atenções atrai é o de Mubarak.

Os milhões de Mubarak

As estimativas sobre a fortuna da família Mubarak são pouco fiáveis, variando entre mil milhões e setenta mil milhões de dólares.

O centro de estudos de Washington "Global Financial Integrity" considera, no entanto, que entre 2000 e 2008, analisando as balanças de pagamentos anuais, terão saído do Egipto 57,2 mil milhões de dólares obtidos através de actos de corrupção administrativa e actividades financeiras ilícitas.

Alguns dos bens de Hosni Mubarak, a mulher Suzanne e os dois filhos, Gamal e Alaa, estão claramente identificados, designadamente investimentos imobiliários no Reino Unido e no Egipto, mas o grosso da fortuna familiar é difícil de rastrear nos meandros da "City" londrina, em Chipre, Omã ou no Panamá.

O processo de constituição da fortuna dos Mubarak é, no entanto, relativamente claro.
O carácter patrimonialista do estado garantiu a acumulação de capital aos detentores do poder, e as privatizações da década de 90 aceleraram o processo de enriquecimento da elite política, através de "joint-ventures" com investidores estrangeiros, constituição de empresas a partir de bens públicos vendidos a preço de saldo e extorsão por via de comissões.

Alguns dos principais associados de Mubarak, como Ahmad Ezz, magnata da siderurgia, viram os seus bens congelados e foram proibidos de viajar para o estrangeiro, mas será difícil à Junta Militar no poder levar a cabo processos judiciais por corrupção que implicarão necessariamente altas patentes das forças armadas.
Jornal de Negócios
16 Fevereiro 2011

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