quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Tempo de resgates

  
   O reconhecimento do fracasso do plano de resgate da Grécia vai provocar uma onda de choque que a maior parte dos políticos europeus dificilmente poderá absorver.
   Atenas não tem qualquer possibilidade de voltar a financiar-se nos mercados a partir do segundo trimestre de 2012, conforme previa o acordo de resgate com a União Europeia e o FMI.

   As projecções mais optimistas apontam para que a dívida pública suba dos 143% do PIB registados em 2010 para valores na ordem dos 160% no próximo ano.

   Os juros que Atenas paga nos mercados inviabilizam a possibilidade de conseguir obter fundos para cobrir desde o próximo ano, nos termos do plano de resgate, pelo menos 75% dos compromissos a médio e longo prazo.

   Os 53 mil milhões de euros que a Grécia já recebeu do pacote de 110 mil milhões de euros concedido faz um ano não tiveram a contrapartida prevista na redução do défice orçamental.

   O défice do orçamento em 2010, ano em que a economia sofreu uma contracção de 4,5%, cifrou-se em 10,5%, comparado com os 15,4% de 2009, e aquém dos 8,1% inicialmente previstos pelo executivo de George Papandreou.

                                          A ruína grega

   Novas medidas de austeridade, esforço redobrado para aumentar as receitas fiscais, além de um plano de privatizações de forma a obter cerca de 50 mil milhões de euros em quatro anos, vão sendo anunciadas pelo governo socialista de Atenas, mas as opções são reduzidas.

   Um novo financiamento de emergência para prover aos compromissos da dívida é uma das hipóteses em negociação com a UE e o FMI a par da redução das taxas de juro pelos empréstimos e alargamento do prazo de liquidação.

   Diversas modalidades de reestruturação parcial da dívida soberana e de crédito colaterizado têm vindo a ser discutidas tendo em vista sobretudo mitigar eventuais perdas dos credores mais expostos - a banca alemã e francesa - e riscos de destabilização financeira da Espanha, Bélgica ou Itália.

   Rever o objectivo de redução do défice orçamental para níveis abaixo dos 3% em 2014 é outra decisão inevitável para a UE com repercussões que já se fizeram sentir na negociação do pacote para Portugal e irão ainda aproveitar à Irlanda.

   A incontornável ruína helénica arrastar-se-á pelo menos por uma década, mas o pacote de resgate relutantemente acordado há um ano serviu desde logo para a banca privada mais exposta diminuir o risco face à Grécia graças aos bons ofícios do "Banco Central Europeu".

                                  O reverso dos planos

   A diminuta dimensão das economias grega, irlandesa e portuguesa, que no conjunto não ultrapassam os 5% do PIB do conjunto da UE, permitiu conter a crise de dívida soberana e balança de pagamentos registada nos três estados da zona euro.

   Na UE assistiu-se igualmente em 2010 à redução dos défices orçamentais agravados pela crise financeira de 2008: a média europeia baixou de 6,3% do PIB em 2009 para 6% no ano passado.

   A expansão das maiores economias, em particular da Alemanha e da França, contrasta, entretanto, com a anemia dos insolventes e no caso grego, tal como no português, os diferenciais de produtividade e a baixa competitividade colocam mesmo em causa a capacidade a prazo destes países se manterem na zona euro.

   A má gestão política das crises do euro tem custos e evidenciou a disfuncionalidade e falta de democraticidade das estruturas de decisão da UE, muito em particular ao relegar para segundo plano os parlamentos nacionais e o Parlamento Europeu.

   Uma união monetária sem política fiscal e económica unificadas está, por outro lado, a revelar-se demasiado incerta, mesmo que os riscos sistémicos tenham sido debelados na fase inicial desta crise.

                                     Mais uns rombos

   Após reiteradas negações da gravidade dos problemas sucederam-se pacotes de resgate que seriam solução para conter a crise sem que os resultados previstos tenham sido alcançados.

   Novos esforços de resgate da Grécia, tal como o pacote português e a revisão dos termos da ajuda a Dublin, serão vistos pelos eleitorados dos estados mais prósperos da UE como um sacrifício dos contribuintes e uma transferência de recursos para países financeiramente irresponsáveis.

   Do lado dos insolventes os custos sociais pesam em demasia na busca de uma superação dos défices, enquanto se reduzem as expectativas de vir a diminuir o fosso em relação às economias em expansão.

   A credibilidade de novos mecanismos de gestão de crises financeiras e dos pactos de crescimento e coesão na União Europeia sofre um rombo a cada novo pacote de resgate.
Jornal de Negócios

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