quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Um recomeço modesto em Moscovo




   O compromisso assumido por Barack Obama e Dmitri Medvedev de reduzir em cerca de um terço os arsenais nucleares dos Estados Unidos e da Rússia permite retomar as negociações sobre armamentos estratégicos, mas pouco avança em relação ao acordo estabelecido entre Vladimir Putin e George Bush há sete anos.

   Nessa altura, Moscovo e Washington tinham acordado limitar o número de ogivas a máximos de 2 200 a 1 700 unidades até 2012, (presentemente, os Estados Unidos dispõem de 2 202 ogivas e a Rússia conta com 2 787, segundo a estimativa do Bulletin of Atomic Scientists) e 1 600 meios de transporte (mísseis balísticos intercontinentais em terra, submarinos e bombardeiros).

   Obama e Medvedev firmaram agora um compromisso político para substituir o Tratado de Redução de Armas Estratégicas (START) de 1991, que expira em Dezembro, por um novo acordo, que reduzirá o número de ogivas para patamares entre as 1 500 e as 1 675 unidades e restringirá os meios de transporte entre os 500 e 1 000 num prazo de sete anos após a assinatura do tratado.

                                           Negociação apressada
  
   O acordo deverá incluir processos de verificação e controlo dos arsenais e implica cinco meses de negociações difíceis sobre qual o estatuto de alguns meios de transporte norte-americanos como as frotas de bombardeiros B-1 e os dispositivos de radar e baterias de defesa anti-mísseis na Polónia e na República Checa.

   Se vingar o novo compromisso, Obama poderá tentar convencer o Senado a ratificar o Tratado de Interdição Total de Testes Nucleares de 1996 e encetar conversações com as demais potências nucleares sobre a criação de um banco internacional de fornecimento de combustíveis para indústria nuclear civil, limitando a produção de matérias físseis, no âmbito das negociações do próximo ano para reforço das provisões do Tratado de Não-Proliferação Nuclear de 1968.
  
   O desenvolvimento de programas de defesa anti-balística com componente espacial, uma das principais preocupações de Moscovo e também Pequim, não foi publicamente abordado nas conversações desta semana, mas terá de ser considerado nas negociações que, na óptica de Medvedev, englobam de facto sistemas ofensivos e defensivos.

   A cooperação entre norte-americanos e russos para contenção da Coreia do Norte e do programa militar nuclear do Irão será outro ponto de convergência possível, mas a influência de Moscovo em Teerão é bastante limitada.

   Os sucessivos atrasos na entrada em funcionamento da central nuclear de Bushehr e no fornecimento de mísseis anti-aéreos S 300 a Teerão demonstram as reticências da Rússia, mas estão longe de implicar a adesão russa às sanções punitivas consideradas por Washington.

   O reconhecimento das divergências quanto à adiada adesão da Geórgia e da Ucrânia à NATO, das propostas russas para criação de novos mecanismos de segurança europeus e acerca dos projectos de construção de gasodutos do Cáspio para fornecimentos à Europa confirma que Washington admite a impossibilidade prática de se opor efectivamente às pretensões russas de criar uma esfera de influência privilegiada no Cáucaso e na Ásia Central.

                                     Parceria limitada


  O reconhecimento do estatuto de grande potência é quanto basta a Moscovo nesta fase e as facilidades concedidas aos Estados Unidos para o esforço de guerra no Afeganistão representam uma concessão praticamente sem custos, mas a limitação da cooperação com Washington a questões de segurança é um indício da fragilidade das relações entre os dois países.

   O investimento norte-americano na Rússia não ultrapassa os 3,4% do investimento directo estrangeiro e as trocas comerciais quedam-se pelos 36,1 mil milhões de dólares, o equivalente ao comércio entre os Estados Unidos e a Polónia.

   Em Moscovo Obama e Medvedev deram os primeiros passos para desbloquear um impasse numa negociação estratégica para reduzir arsenais nucleares e que poderá, inclusivamente, contribuir para reduzir riscos de proliferação, mas a cooperação entre a Rússia e os Estados Unidos mantém-se, de facto, confinada a questões de segurança.

Jornal de Negócios
08 Julho 2009

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